"Quanto tempo. Outra vez. Igual sempre.
São duas da manhã e estou tendo um lindo dia de cólica. É
uma sensação esquisita ser grata por menstruar e ao mesmo tempo sofrer e querer
chutar paredes por isso.
Sei lá, acho que isso significa que atingi minha maturidade
em termos de ser menstruante. O que é uma bela bosta. Significa simplesmente
que agora tenho que me preocupar com a possibilidade de ter tecido vivo a parte
de mim (e ainda assim, dentro de mim).
Isso é algo que eu preciso digerir ainda. Não sei bem o que
eu acho sobre sexo. Por enquanto não cheguei a um estado de reflexão sobre isso
que me norteie em relação a preferências.
Acho que gosto mais do ato no plano das idéias. Me parece
bem mais legal do que é. Enfim, isso fica pra outro dia.
Faltam exatamente cinco semanas pra eu voltar pra casa. Meu
Deus, como eu tenho esperado esse momento!
Estou terminando o curso, terminando minha jornada
torturante de convivência com o bando de gente nojenta com quem me desiludi,
finalmente.
Não cheguei a comentar aqui nem 2% do show de horrores que
se passou nesse período canadense da minha vida. Dava pra escrever uma série,
porque olha, é tanto absurdo que é difícil imaginar que aconteça no dia a dia.
Mas estou bem, apesar de tudo. Muitíssimo melhor que dois
meses atrás.
Um amigo meu da Holanda (o Thomas) teve um surto e o Canada simplesmente o traumatizou mais ainda
com seus procedimentos absurdos na conduta do sistema de saúde.
Eu falo que a saúde daqui é uma bosta. A cada dia novas
provas.
Tendo esse caso tão triste do meu querido Thomas tão
próximo, minha vida está em perspectiva, creio.
Meu amigo Guilherme (o brasileiro que trabalha como animador
aqui e quer por tudo na vida que eu fique no Canadá) está tão empenhado em me
ajudar a ficar aqui que está até falando com o povo com quem já trabalhou pra
que eles me contratem se acharem que tenho potencial.
É um paradoxo, porque todos os segundos da minha existência
nesse lugar ressoam o quanto quero voltar pro Brasil, mas quando encontro com
ele, o entusiasmo e verdade com que ele se preocupa e genuinamente quer o
melhor pra mim (que seria ficar aqui, pra ele) faz com que minha alma se divida
e fique um pouco nublada nessa questão.
Nublada a ponto de enquanto estou com ele eu sentir vontade
de ficar e ver as coisas dando certo aqui. Me ver dando certo aqui. Mas no
momento em que saio dessa bolha volta todo meu desespero em estar longe de casa.
Longe da minha família, amigos... Longe dos meus avós.
Eles são a principal razão pela qual quero e preciso voltar.
Nem sei se falei aqui disso... É algo que pesa tanto no
coração da minha família, martela todos os dias minha cabeça.
Minha avó foi diagnosticada com Alzheimer há mais ou menos
um ano. Já tínhamos notado sinais dois anos antes disso, mas ela se recusava a
realizar os exames e consultar o neurologista.
Agora não é uma fase aguda, mas é nítido como ela mudou e
como a memória dela está comprometida. Isso me dá tanto desespero. Sequer
consigo pensar muito tempo no assunto.
Preciso voltar pra ela. Pro meu avô, que tem que carregar
essa dor no coração a cada segundo do dia junto dela. Não agüento o fato de
estar perdendo preciosos segundos de consciência da vida deles. Isso me apavora
demais.
Pois é, por isso minha alma clama voltar pro meu país. Mesmo
que a política esteja em chamas, o mercado de trabalho uma piada, nada importa
mais do que eles.
Vou me submeter ao que for, mas não vou me arrepender nunca
de não ter vivido ao lado dos meus dois maravilhosos velhinhos. Sei que nunca
me perdoaria se não o fizesse.
É duro, deixar uma chance brilhante pra trás e seguir rumo a
uma grande possibilidade de mediocridade, mas faço de bom grado.
Não vejo a hora de voltar pra casa."
03/08/18
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