25/12/2025

Filhotes numa caixa


Feliz natal, né?
Diretamente do meu apartamento, quase na completa escuridão pra poder ficar com a janela aberta sem atrair todos os mosquitos de São Paulo pra dentro de casa. Até que enfim, veio aí o post que vai tentar comportar tudo que tem ocupado minha cabeça. 

Bem, por onde  começar, não é mesmo?

Sei lá, ontem eu sonhei que tinha recebido uma caixa com 4 gatinhos resgatados que eu deveria cuidar por um tempo até poder levá-los pro lar temporário oficial onde eles ficariam. Cuidei deles, eles tavam bem, etc. Daí o sonho continuou e apareceram mais gatos (sim, um sonho cheio deles) na minha suposta casa (um lugar que nunca vi na vida haha) e eis que... Me lembro dos gatinhos da caixa e percebo que não tinha memória alguma de deixá-los com a pessoa do lar temporário oficial. Me dá 5min de desespero, saio procurando pela casa e encontro a caixa de papelão com os 4 filhotes lá dentro, esquecidos por 1 semana. Eu engulo seco, abro a caixa e começo a avaliar como eles estão, limpando as carinhas remelentas, vendo o nível de subnutrição, desidratação... o nível da minha culpa basicamente. 
Juro, horroroso. 
E no sonho eles todos sobreviveram!! O que é incrível, mas bem alinhado com a minha baixíssima capacidade de lidar com a repercussão lógica de deixá-los UMA SEMANA sem cuidado, água ou comida fechados. Enfim, acordei desse sonho me sentindo um lixo, sem conseguir tirar da cabeça a sensação de ter que lidar com aquela situação. Que eu causei, porque esqueci do próximo passo. Eu cuidei deles, fiz a minha parte da tarefa. Só esqueci de levá-los pra segunda parte. Senti que foi um golpe baixíssimo do meu inconsciente levantar esse medo logo no natal. No recesso da minha psicóloga. Minha última sessão do ano foi dia 23, por que não vir essa merda de sonho dia 22?? 

O verão tem sido bem difícil pro Biscoito. A nefro explicou que o calor pode fazer ele ficar desregulado e piorar os sintomas, além do fato de ele estar na última fase da doença, que também torna qualquer mínima coisa um gatilho de crise. Essa semana tem sido bem difícil com ele. Sem querer comer direito, chateado, meu coração em pedaços.

Num outro tópico de esquecimento, e esse é um que nem consegui falar pra Aline, minha vó começou a esquecer quem a gente é. Ela trata todo mundo com carinho e se lembra na maior parte do tempo quando estamos reunidos, mas meu avô tem ficado desesperado por ela não se lembrar quando estão sozinhos. 
Ela está confundindo que é mãe dos filhos, ou que tem eles, ou que eu existo... Enfim, coisas esperadas pra alguém com 10 anos de demência diagnosticada. E sei que o quadro dela é incrível, considerando como foi devagar a progressão de tudo. Mas chegar na porta da pior fase nunca é fácil.

Confesso que me chocou mais do que o esperado, quando vi acontecer ao vivo. E depois só consegui pensar na imensidão de tristeza e desespero que meu avô deve navegar nesses últimos meses, e o que está por vir. Sinceramente nem alcanço pensar numa realidade pior que isso. 
Não que importe, porque vai rolar a gente estando pronto ou não. 

Ai ai como eu amo as incertezas da vida. Todas elas tem convergido esse ano pra eu olhar afetuosamente pro começo de 2025, quando o caminhão de merda não tinha sido despejado no meu caminho.

Ah sim, há umas duas semanas atrás fui na festinha de fim de ano dos grupos de afinidade da minha empresa. Foi ok, considerando o cenário de total desmobilização e desmonte dos grupos nesse ano. Mas o que quero contar foi a dinâmica que fizeram, facilitada pela dona de um dos nossos parceiros de "terapias holísticas". Juro, só de escrever isso já me faz querer revirar os olhos.

Bem, eis que essa querida começa uma atividade de meditação guiada em que a gente tinha que: Primeiro, encontrar com nosso "eu" do começo do ano e contar tudo que aconteceu, comemorar, falar o que tinhamos vivido, aprendido, ser gratos; toda essa pataquada. Aí eu já tava querendo chorar. Só de pensar em tudo que passei esse ano, todos os baixos e mais baixos com o Biscoito. De pensar na consulta uma semana antes em que tive que conversar sobre o futuro terminal dele, pensar em rotas alternativas para diferentes cenários de colapso. De fato, só coisas incríveis pra contar pro meu eu de janeiro, eu não perdia por esperar. 
Como sempre dá pra piorar a parte dois da meditação incluía visualizar seu "eu criança" e ficar zanzando com ele pela sua consciência, conversando, vendo se os sonhos ainda eram os mesmos, o que tinha dado certo, se levando pra passear, bla bla. 
Bem, é claro que mais uma vez se tem alguém que odiaria saber que estamos num barco afundando com nosso gato, este alguém é a minha criança. E por mais uns bons minutos fiquei lá tentando não chorar enquanto tudo que eu conseguia mentalizar era eu e mais eu fazendo carinho no Biscoito, apresentando ele, transpassando o sentimento sem falar nada. Ficando triste duas vezes. Parabéns aos organizadores, evento maravilhoso.

Na semana seguinte quando contei todo esse absurdo pra Aline, que ficou chocada e muito brava, com toda razão, pois como alguém sem preparo nenhum faz uma dinâmica dessas. E, na real, mesmo alguém preparado não deveria fazer nada disso, pois: maior ativador de gatilhos esse tema de meditação aí, tinha que ser proibido fora da sessão de terapia, isso sim.
Daí nessa sessão pós ocorrido, lembrei que meu maior sonho quando criança era "ser uma pessoa de muito sucesso pra poder dar a melhor vida possível pras crianças que eu adotaria". E assim, era realmente isso, eu rezava todas as noites pedindo por isso. A minha maior aspiração na vida era e é, de certa forma, proporcionar uma vida impecável pra vidinha que depende de mim. 

E estou incapaz de fazer isso no momento presente. Claro que relembrar isso só me fez chorar ainda mais. Acho que qualquer eu do passado ou futuro só tem a sofrer com esse presente. O meu querer é "básico", nada ambicioso, a primeira vista. Mas é impossível, e é tirado de mim. Eu falho todos os dias, apesar de tudo que fiz e faço pra chegar lá.

Veio o sucesso profissional, veio a condição financeira relativa, mas como não é só isso... fico a desejar. E a culpa não é minha nem de ninguém. Meu sonho só vai contra a imprevisibilidade da vida. E é isso.

Sei lá, agora tudo que depende de mim também parece ser maior que eu. Remédios, comida em porções medidas grama por grama, atenção aos sinais, flexibilidade com sintomas esperados, e trabalho, e viver, e comer, e dormir, e acordar de madrugada pra dar comida, mas e se não me acordar de madrugada, e não querer pegar no sono pro amanhã não chegar. Tô casande. E não posso deixar nada passar, mas eu deixo. 
No fim, sinto que meu maior medo agora é desligar o cérebro num momento e perceber quando já é tarde que aquele era o momento crucial. Parabéns ao meu inconsciente por trazer à superfície essa angústia que ainda não tinha sido nomeada. 

Enfim, vamos indo com medo mesmo.

P.s.: Depois vou fazer uma postagem com coisas boas e felizes, porque não foi tudo dor e sofrimento. É só que agora recontar muito da dor e sofrimento existentes já acabou com a minha bateria. 

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